quarta-feira, 30 de julho de 2008

"Fica na tua". "Fico, porra nenhuma"

As cadeiras eram as 1 e 2, 5 e 6, que são as quatro primeiras, atrás do motorista. A minha era a 6 - a passagem bom Nanão comprou pra mim, todo orgulhoso por ter achado um assento no corredor bem longe do banheiro.

Fato é que nas da frente estavam um casal - a mulher com um bebê no colo - e uma menina de seus 12 anos. Nas de trás, os outros dois filhos, meninos duns seis e oito anos, embolados, dormindo. Nenhum espaço, naturalmente, pra esta autora, que perguntou, quase docemente.

- Ele vai no meu colo, é isso?

Foi a senha pros dois serem arrastados a puxões pela anta do pai. Um deles, coitado, dormindo ainda durante a operação. Ato contínuo, o casal botou em prática o que já deveria estar combinado no caso de o ocupante da cadeira 6 aparecer - quem viaja no trecho guarda sempre a esperança de o assento do lado ficar vazio, o que, às vezes, acontece, mesmo. Fato é que a mãe veio com o bebê no colo pra poltrona 5, na janela, ao meu lado; e as crianças, todas, foram pras duas poltronas da frente, com o pai. Vou falar de novo: em duas poltronas, ficaram três crianças crescidinhas e um adulto. Na de trás, a mulher com o bebê e eu.

À certa altura, a menina, a mais velha, encheu o saco de ficar se apertando nas duas poltronas e decidiu ficar encolhidinha no chão, aos pés do pai e dos irmãos, cabeça entre os joelhos, dormindo, o que quase partiu meu coração e me deixou indignada com a anta do pai.

Do meu lado, acabei descobrindo que o bebê era uma menina, que, se não era muda, era a criança mais calma do mundo. Mamou uma parte considerável das cinco horas e meia de viagem e não deu um pio. Melhor pra ela: a irritação foi me fervendo o sangue a cada vez que a mãe vinha invadindo meu espaço aéreo, se mexendo de um lado pro outro, enfiando a cabeça do bebê nas minhas costas (fiquei de ladinho, fuça virada pro corredor), convencida de que tinha direito a uma poltrona e meia. Se aquela criança abrisse o berreiro, nem sei, nem sei...

Mas, enfim, decidida a não arrumar confusão com uma pobre mãe com seu bebê no colo e convencida de que não ia conseguir dormir de jeito nenhum, enchi o saco, peguei o notebook e me sentei no corredor pra adiantar umas traduções que precisava entregar na terça-feira.

A certa altura, o pai-anta coloca em prática outra parte do plano brilhante de embarcar a família de seis pagando três passagens e manda a filha mais velha ver se tinha algum lugar vago no ônibus. Negativo, e a menina, sábia, decidiu dar um tempo e viajar em pé. Claro, que antes disso, passou por cima de mim, mas foi super-legítimo, afinal, eu também não tinha nada que estar sentada no chão. Mas foi super-sem stress: eu me encolhi; ela passou, jeitosa.

Na volta, a mesma coisa, com a pobre resmungando pro pai que não queria viajar sentada aos pés dele e dos irmãos. Tomou uma bronca do escroto, que, por sua vez, tomou uma desta autora indignada com o tratamento que o traste tava dando à família - a anta tava zangadinha porque, olha que absurdo, não tinha nenhum lugar vazio pra ele acomodar a filha de graça.

- Vem cá, você não tem vergonha, não? Tá achando que ninguém tá vendo você tentar enfiar seis pessoas em três poltronas? E quatro crianças viajando assim. (...) E tem mais: não dá bronca na menina perto de mim, não.
- Fica na tua.
- Fico, porra nenhuma. Tá todo mundo quieto porque quem tá incomodada aqui, do lado, sou eu.

A mãe ficou muda. Crianças, todas, mudas. E a anta, depois do inócuo "fica na tua", também emudeceu.

Foi assim.

P.S.: É claro que o sujeito não devia era ter dinheiro, mesmo. Mas ele ficar indignado porque a menina percebeu que, já grandinha, não cabia nas duas poltronas com outros três seres humanos e que o melhor, mesmo, era viajar em pé, me enfureceu.
P.S.1: Não, não me orgulho.

4 comentários:

Anônimo disse...

rozane,
quem tb tinha que levar esporro e ser denunciada era a empresa que vendeu as passagens. e o motorista que permitiu a entrada das crianças nestas condições tb errou feio.
agora, você estava certíssima. o cara, duro ou não era uma anta. metido a "ixperto", mas uma anta.
mirtes

ROZANE MONTEIRO disse...

pois é, é claro que pensei em armar um banzé. mas fiquei com medo dos malucos botarem a família pra fora, com bebê e tudo. ia morrer de culpa. amarelei.

Anônimo disse...

mas, você ja´pensou no perigo que a menina sofreu? se houvesse uma freiada brusca, ou qq coisa assim?
cara eu o-deiou pais antas.

ROZANE MONTEIRO disse...

eu sei, babe, eu sei. ela ficou, literalmente, sentadinha, cabeça entre os joelhos, meio que cochilando, entre os primeiros bancos daquela fila e aquela divisória que separa os passageiros do motorista, aos pés dos machos da família, que raiva, devo admitir.

se tivesse freada brusca, ela se danaria toda, e os irmãos despencariam, imediatamente, por cima dela. seria o caos.

caralho, não tinha pensado nisso. freudiei.