quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Na sarjeta

De que já frequentei, metaforicamente, a sarjeta, todo mundo aqui já faz uma idéia. Literalmente, foi a primeira vez, juro.

Foi assim:

Escoltadas pra fora do Sambódromo pelos seguranças fofos, eu e minha parceira de show achamos que fazia o maior sentido do mundo tomar mais uma cerveja - ainda rolava certa confusão pra pegar táxi. Olhamos prum lado, olhamos pro outro, vimos um ambulante vendendo o produto. Adquiridos e pagos dois latões, fomos convencidas pelo fofo de que era melhor tomar uma e, depois, pegar a outra, pra não esquentar.

- Mas tu não vai embora? - eu, perguntadeira.

- Vou, não.

- Se for, te busco no inferno.

Esse era o João, que tava de olho brilhando pra minha parceira de show.

Conversa vai, conversa vem, uma ou outra roupa suja lavada ali em público por conta de alguma ziquizira do passado, nós duas, cansadas das mais de quatro horas de show, achamos que a melhor ideia seria sentar no meio-fio e ir falando da vida, dos amores, da adolescência, dos temores de agora, etc, etc, etc.

Do lado de um bueiro.

Como se não houvesse amanhã.

Sei lá, o show de Lady Elton nos despertou, assim, os instintos mais primitivos, uma coisa meio Woodstock, meio "all you need is love".

Bom João sentou do lado e foi se enturmando, claro, com a antena ligada na nossa conversa. Minutos depois, Edson, outro ambulante, foi se chegando e, adivinhem, também sentou e foi ficando, também de olho na minha parceira de show.

Necessário dizer que a parceira de show é pessoa que gosta de registrar momentos importantes de sua biografia. Para tal, adquiriu uma honestíssima máquina fotográfica descartável, que, claro, foi parar na mão de João - sim, este relato tem registro fotográfico. O melhor foi a patrulha que encostou logo depois da foto, com o PM cismando que o ambulante tinha fotografado a mesma e ameaçando tomar a máquina. Noves fora zero, minha companheira explicou, toda doce, que não era nada disso e me beliscou o braço umas 30 vezes quando eu fui tentar me meter, assim, digamos, menos docemente que ela. O PM se conformou, devolveu a máquina e sumiu.

Mais conversa pra lá, mais conversa pra cá, Edson já todo, todo, virando a cabecinha pra minha companheira de sarjeta, os dois decidiram que o lugar começava a ficar deserto demais, e que era melhor a gente ir pra mais adiante. Sim, é o que vocês estão pensando: a gente se distraiu tanto ali, falando da vida, que a hora passou, e a gente nem sentiu. Ah, sim, importante registrar que lembro de ter visto os dois cochichando, naquele estilo quem-vai-ficar-com-quem. Ato contínuo, Edson partiu, ainda mais galante, pra puxar assunto com minha amiga; João, imediatamente, passou a me olhar com a cabecinha virada.

E fomos assim, caminhando pela rua: nós duas e os moços empurrando suas carrocinhas, galantes. Lindo.

Só não foi mais lindo porque minha companheira teve um surto de lucidez, viu um táxi livre, resolveu que já tava na nossa hora, e nos mandamos, dignas, pra, sabe Deus por que, discutirmos a questão palestino-israelense, eloquentes, na viagem inteira até o Largo do Machado.

Ah, sim, na despedida, João beijou, docemente, minha mão, e mandou um "não vai embora, não" de filme.

Informação relevante: ninguém ali tava completamente bêbada, o que só piora a situação. Foi sarjeta em estado de lucidez. Não, não me orgulho.

3 comentários:

Anônimo disse...

de praga para sarjeta do sambodrómo!!!!
amiga, realmente você já teve noites mais gloriosas!!!!!!!!!
mas, tudo bem, apesar do final rozeano, o importante é que teve elton na parada.
e mais, que você estava com alguém um pouco mais ajuizada...
agora, os textos estão ma-ra-vi-lho-sos

ROZANE MONTEIRO disse...

amiga, brigada pelo elogio aos textos. quanto ao "alguém mais ajuizada", lembro que poupei todos aqui dos detalhes sórdidos. "ajuizada", né? ãrrã, ãrrã, ãrrã. quanto às "noites mais gloriosas", devo lembrar que também já tive noites mais elameadas. portanto, sarjeta no sambódromo, mais ou menos sã, é, praticamente, lucro na minha modesta biografia.

Anônimo disse...

esta é a rozane que eu admiro!!!!!!!
beijim amiga.